Os jograis de Wall Street
Nirlando Beirão
Eram tão seguros de si, os pobres-diabos, com sua assertiva sabedoria de pitonisas. Sabiam tudo da conjuntura e do futuro. Falavam em acerto fiscal e criticavam os gastos públicos. Diziam coisas como: o Brasil tem de fazer a lição de casa. A globalização é irreversível. Não podemos ficar de costas para o mundo. O governo Lula não terá da comunidade financeira internacional o benefício da dúvida. O Estado é a opressão. Liberdade para o mercado.
A bordo de suas gravatas- borboletas, de seus cabelos lançados ao léu, de bochechas inchadas por batatas fonoaudiólogas, tudo muito de acordo com o figurino Chicago Boys (and girls), proferiam absurdos e profetizavam catástrofes. Viviam a certeza dos tolos. Sempre trilhando atalhos político-partidários.
Se você é, por exemplo, casado com um empolado scholar que presta serviços ao PSDB, sua obrigação é dizer que, se algo passa bem na administração de seu adversário de classe, não é por mérito dele – é porque "a administração anterior plantou raízes para o futuro".
A gente não se surpreende mais com a má-fé dessa gente. Eles vivem para agradar aos patrões. Na virada dos anos 90, o muro caiu, o de Berlim – símbolo do comunismo. O FMI assumiu o poder sem contrapeso. Os tais telecomentaristas se submeteram ao consenso rebarbativo, sem imaginação. Passaram os anos subseqüentes sem entender que o capitalismo, em sua descabelada versão ultra, se era benéfico a privilegiados como eles, na precária ceia dos cardeais midiáticos, nem por isso seria o melhor dos mundos para a humanidade toda. Ninguém jamais se perguntou: será o hipercapitalismo hegemônico a salvação da África Negra? Do Magreb? Da América Latina?
Os profetas da teleprosperidade foram alinhando, num paredón ideológico, os tais adversários do progresso: Cuba, Chávez, Lula, o PT, o Estado de Bem-Estar, a Previdência Social, os socialistas europeus, os liberais americanos. Sabichões panglossianos papagueando-se a si mesmos, ventríloquos da verdade absoluta ditada pelo Grande Irmão Capitalista. Fora de Wall Street, pregavam, não há salvação.
Longe deste colunista querer caçar o ofício dos coleguinhas espertalhões. A gente sabe que a teleturma da economia tem de manter alto padrão de vida. Mas, com tudo isso que está acontecendo por aí, não seria o caso de oferecer a eles o piedoso refresco de umas férias remuneradas? Estão perplexos, os coitados. De todo modo, não se emendam. Penso nos telecomentaristas do futebol. Eles distorcem, manipulam, mas vestem a camisa de seus times. Os telecomentaristas de economia, não. Fazem-se de sérios e isentos. Enquanto o capitalismo pega fogo, encenam a hilariante seriedade de seu picadeiro. Besteiras são moeda de livre curso. Não seria o caso de processar por charlatanismo, com base na Lei do Consumidor?
"A dura lição (dessa crise mundial) é que a moeda, os bancos e o capitalismo de um país não valem mais que o governo que os garante. Mais uma vez, custou caro a ilusão de que o mercado é solução para tudo e o Estado é o problema."
(revista Carta Capital, No.518, 22/10/2008)
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