segunda-feira, maio 26, 2008

Mendes Junior concorrendo 2 vezes

Esse abaixo é um dos 2 contos de Mendes Junior classificados para concorrer ao Prêmio Lima Barreto.


O outro conto selecionado de Mendes Junior é o A Vendedora de Maçãs.


II CONCURSO NACIONAL DE LITERATURA
ARTI- MANHAS


Lima, limeira e um amor para contar

Estou convencido da paixão - tanto que falo em primeira pessoa: sou pós-adolescente, me dou mal em física, nada entendo de música, não fumo cigarro nem erva, e sigo namorando uma limeira (frondosa). Bem, digo também que é uma limeira contida e sensata, não fosse o estranhamento de outrora quando me balancei por uma roseira. Ciúmes? Provavelmente. Mas qual o motivo da roseira na história mais maluca e impertinente que ei de contar para vocês todos, que, feito workaholic, não têm mais tempo de pensar em assunto algum senão do trabalho que há de vir na manhã que ainda não vejo? Tudo escuro, senhores, e estas teclas não cessam de me imperticar a já malfadada vista, que não mais é capaz de dizer quem são vocês - por pouco não os conheço - talvez é possível apenas de vista. Como diria Clarice: a pré-pré-pré-pré-história (acrescentei duas condições) - sou além, ora! Também sou um workaholic e não mais capaz de distinguir o profissional do pessoal - farinha do saco - é tudo a mesma. Mesma o quê? E quanto à roseira? E já notaram como não gosto de ponto de gramática escorreito: escrevo do jeito que me apetece, não sou escritor. E você, gosta de alguma coisa? Eu sim: da minha limeira, não mais da roseira, que apenas entrou para fazer um par, tolos! Dançar um tango (argentino) e nada mais a fazer. Sou do Topo do Pagão, vizinho de terras inodoras, como diria meu velho pai falecido do coração. Enfim, sem delongas, sou cria de gente que num triste dia empunhou um facão para demarcar o ar, que ainda assim foi vendido enganosamente (?) por moeda barata para sabe lá quem - Deus do céu! Não me queixo - ce la vie... Mas é bom que se diga que minha limeira fica no quintal do terreno que me sobrou como único pé para pisar alho num pilão de madeira, deitar em rede mansa e fazer do fim da caça a anchura da satisfação das gentes - falo de mim, que nada sei das respostas da vida e, portanto, serei sempre o fiel escudeiro (quixotesco) desta limeira. Não vim das Índias e tenho vontade de ir para qualquer ilha: da Madeira, do Sal, Canárias, tal como um criminoso daqui sendo degredado alhures, e prometo levar junto do fim da jornada a esperança de permitir minha limeira, uma lima, ou o fundo da terra, que, provavelmente, antes d´eu nascer com o nariz torto, o dedo grande cheio de calo e um nome qualquer envelhecido, já devia ser adorada, amada e beijada. Inveja, minha senhora, meu senhor? Qualquer coisa parecida com o amor e a falta de atração de outrem(ns)? Avise, antes de que seja tarde! Eu, por mim, nasci no interior, gosto de trabalho honesto, cuspo na mentira, aprecio um chamego, sou dado à safadeza sem limite, quando muito sou mulher, às vezes me faço de homem, outras não sou ninguém, nada, coisa nenhuma, um lixo, mas desejo uma lima, desejo algo, sonho com algo, quero algo, ouviram? Imagino esfregando meu corpo na limeira sem espinhos, que corre agora doce pelas fendas da minha vida pueril e pelo lado visceral. Sabe quando se sonha em ser mágico? Quando se quer ser herói? É quando se quer tecer pano com linhas já tra(n)çadas por quem um dia lhe quis bem. Minha primeira namorada não foi o porquinho do Bandeira, não foi uma roseira, não foi uma normalista, não foi uma professora, não foi uma balconista, não foi uma doutora, não foi uma doméstica, não foi uma cunhada, não foi uma telefonista, não foi uma irmã, não foi uma mulher pública, não foi minha mãe, como quer Freud - foi uma linda limeira. Mas até lá meus olhos viram uma pequena coisa despontando a partir da terra, e como tudo foi difícil! - quase como a pedra de Drummond - ou a pedra seria uma alusão à valquíria? - ou a pedra seria a eclosão do nascidiço coração? - ou a pedra seria tão-somente uma pedra - um mineral sólido? Qual nada! Depois vi a chama (ardente) que seguia da lima (gostaram da sinestesia?, mas repito: não sou escritor), que se dependurou no quintal, até tocar o lençol rasgado que recobria em parte meu corpo muito afeito aos anseios do sexo: e eu sentindo o amor da juventude e as portas do mundo sendo descortinadas. Descobri, entretanto, através de uma atuação pífia no inner stage, que poderia muitíssimo bem caminhar sozinho mas em plagas distintas - já quase não havia ninguém para com quem compartilhar o desespero. Mas quem quer saber da tragédia alheia? Desde que carregue a imagem de barro da linda visão sempre ao lado da angústia, eu! Imagino aquilo que procura em mim a lima: você me ama?,claro, você me quer?, claro, você sente o meu perfume?, claro, então me chupa!


Mendes Junior



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